Marie Dressler, nascida Leila Marie Koerber em 9 de novembro de 1868, em Cobourg, Ontário, Canadá, foi uma das figuras mais marcantes do cinema e do teatro na transição entre o século XIX e o século XX, destacando-se por sua versatilidade, carisma incomum e por sua ascensão meteórica em Hollywood, já na maturidade. Sua trajetória de vida é não apenas a de uma artista talentosa, mas também de uma mulher que desafiou os padrões de beleza e idade impostos pela indústria do entretenimento, conquistando o respeito do público e da crítica em uma época em que o estrelato feminino era reservado, quase exclusivamente, a jovens atrizes com beleza padronizada.
Filha de pais de origem alemã, Marie teve uma educação musical e artística desde cedo. Seu pai era organista e professor de música, o que favoreceu o contato precoce com o meio artístico. Desde jovem, ela demonstrava uma personalidade forte e um talento cômico natural, características que logo chamariam a atenção. Aos 14 anos, mentindo sobre sua idade, ingressou em uma companhia teatral itinerante nos Estados Unidos, começando a carreira com trabalhos em pequenas produções e peças de repertório. Nos primeiros anos, Dressler participou de companhias modestas, fazendo o circuito vaudeville e apresentações em cidades pequenas, enfrentando dificuldades, mas também adquirindo uma sólida formação cênica, aprendendo a entreter públicos diversos com presença de palco e improviso.
Com o passar do tempo, Dressler foi se consolidando como atriz cômica, destacando-se por seu estilo burlesco, sua capacidade de rir de si mesma e pela construção de personagens femininas fortes, robustas e espirituosas. Sua primeira grande chance veio nos palcos da Broadway, onde obteve um sucesso considerável com a peça “Hanky Panky” em 1912, consolidando sua imagem como uma comediante popular. Sua fama nos palcos cresceu ainda mais com a criação da personagem Tillie, uma mulher atrapalhada e exagerada que conquistou o público pela autenticidade. O sucesso da personagem foi tão grande que ela migrou para o cinema, estrelando o filme “Tillie’s Punctured Romance” em 1914, ao lado de Charles Chaplin e Mabel Normand. Esse filme é considerado o primeiro longa-metragem de comédia da história do cinema e marcou um divisor de águas na carreira de Dressler, tornando-a uma das primeiras estrelas do cinema mudo.
Apesar do sucesso inicial no cinema, sua carreira enfrentou altos e baixos nas décadas seguintes. Com a mudança de estilos e padrões na indústria, ela passou por períodos de ostracismo. Durante a década de 1920, Dressler chegou a viver momentos de dificuldade financeira e quase abandono artístico, sendo considerada por muitos uma estrela do passado. Em alguns períodos, ela trabalhou como telefonista e chegou a vender seus móveis para sobreviver. No entanto, sua resiliência e amor pela arte a mantiveram persistente, mesmo diante das adversidades.
A grande virada em sua carreira veio no final dos anos 1920, quando ela, já na casa dos 60 anos, conseguiu um retorno triunfante a Hollywood. Com a chegada do cinema falado, Dressler mostrou-se ainda mais eficaz como atriz cômica e dramática, graças à sua voz poderosa e dicção clara. Seu retorno foi marcado por uma atuação impressionante no filme “Anna Christie” (1930), estrelado por Greta Garbo, em que Dressler teve um papel coadjuvante, mas memorável, como Marthy Owen. A crítica e o público elogiaram sua performance, e ela rapidamente voltou ao centro da indústria cinematográfica.
O reconhecimento máximo veio com o filme “Min and Bill” (1930), em que ela atuou ao lado de Wallace Beery. Por sua interpretação de Min Divot, uma dona de bar rude, mas de bom coração, Dressler ganhou o Oscar de Melhor Atriz em 1931, consagrando-se como uma das poucas mulheres maduras a receber esse prêmio na época. Sua vitória foi simbólica, quebrando paradigmas e provando que o talento e a autenticidade podiam superar os padrões tradicionais de beleza em Hollywood.
Durante os anos seguintes, Marie Dressler foi uma das atrizes mais bem pagas e queridas dos Estados Unidos. Atuou em diversos filmes de sucesso, como “Emma” (1932), “Dinner at Eight” (1933) e “Tugboat Annie” (1933). Sua presença nos filmes era uma garantia de sucesso nas bilheterias. Ela interpretava mulheres comuns, fortes, engraçadas e compassivas, conectando-se profundamente com o público da época, especialmente durante os anos da Grande Depressão, quando sua imagem de mulher batalhadora e solidária encontrava eco no imaginário coletivo.
Apesar do renascimento artístico e do sucesso financeiro, Dressler enfrentava problemas de saúde. Em meados da década de 1930, foi diagnosticada com câncer, mas optou por manter sua condição em segredo, continuando a trabalhar enquanto suas forças permitiam. Sua última atuação foi no filme “Christopher Bean” (1933), e até o fim, demonstrou dedicação e paixão pela arte.
Marie Dressler faleceu em 28 de julho de 1934, aos 65 anos, em Santa Bárbara, Califórnia. Sua morte foi amplamente noticiada e lamentada. Foi enterrada em sua cidade natal de Cobourg, onde hoje existe um museu e um festival em sua homenagem. Seu legado permanece como símbolo de superação, talento e coragem no universo artístico.
Dressler foi uma pioneira não apenas por seus feitos cinematográficos, mas também por ser uma das primeiras mulheres a alcançar sucesso em Hollywood rompendo com os estereótipos da juventude e da beleza idealizada. Em um meio dominado por padrões rígidos, ela foi uma exceção admirável: uma mulher comedida, espirituosa e profundamente humana. Seu nome é lembrado entre os grandes do cinema clássico e sua história continua a inspirar gerações de artistas que, como ela, enfrentam desafios e resistências em busca de reconhecimento por seu talento genuíno.
A trajetória de Marie Dressler é, assim, um testemunho do poder da perseverança, da autenticidade e do amor pela arte, qualidades que a tornaram uma lenda do cinema e uma figura eternamente respeitada na história da atuação.
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